Do seu livro ainda
inédito “KNK”, este portal publica cinco poemas de Luís Filipe Sarmento. Voz de
visita obrigatória, “ibn Mucana” orgulha-se de dar repetida guarida à produção
deste poeta português. Sempre bem-vindo. (ver também post 0024, AQUI)
4.
Entende-se como
antecipação de uma experiência em si:
resguarda o passo,
efectua o gesto, a sensibilidade expõem-no
ao pensamento, alimenta
o ensaio possível. O sorriso dilacera
a obscuridade, ilumina
a ciência que expande o desejo previsto.
Na sua intimidade
reserva-se a razão pura: o entendimento
que o faz acontecer,
desbravando entranhas até ao núcleo
onde fragmentos se
dissipam na unidade.
Cofre de ideias
possíveis, a combustão do seu motor
põe em marcha o traço
no espaço e no tempo, projectando-o.
A ideia de si e do
mundo é a crença que o transfigura
em cada passo,
transcende-se quando entende o cosmos em si.
5.
Sabe que tudo é formado
por coisas simples
e nada simples é
tudo é necessário e
mortal. Do dogma à crítica transcendente,
o fragmento da
totalidade no espaço e no tempo
é o que se intui, nem
olho de deus nem arquitecto do universo
nem ser necessário,
nega a sua necessária existência.
A razão de ser de todas
as coisas não é deus, talvez a coisa
não se demonstre por
impossibilidade da sua nudez ideal.
Do natural defeito ao
erro irracional,
a refutação de uma
falsa origem, o buraco negro e o seu esplendor
imaginariamente
artístico. Onde as periferias são sugadas
e aniquiladas por uma
potência teórica
da qual pouco se sabe.
O movimento, sem roda nem deus,
faz da expansão a sua
existência comum num lugar a haver.
6.
Que lugar tem a ciência
no mundo transcendente?
Pensa na água e na
matéria do planeta, no sangue
e na mãe-fenómeno, a
extensão do real à dilatação
dos olhos, o
deslumbramento dos líquidos veneráveis,
a varanda suspensa
sobre as interrogações
que navegam nos abismos
dos mistérios concedidos
à observação; pensa nas
coisas em si, na sua fulgurância
fenoménica, o que dos
enigmas apreende,
o inexplicável na
orografia da ciência,
o paradoxo de ser
subterrâneo e aéreo a um tempo desconexo.
A razão especula (e ele
ri no sossego do seu desassossego)
o que à existência a
impossibilidade nega à resposta:
se a alma existe na
eternidade
e se deus não é um
auto-retrato do medo.
7.
A causa daquele olhar
foi a minha distração;
não houve recepção à
lucidez daquela presença.
Inconscientemente
omisso do mundo, a única existência
na abstração era a
arquitectura do edifício da palavra.
Saber e acção, sem a
ilusão quotidiana de um olhar,
razão e manifestação da
ideia, texto em carne viva,
o sangue nas
entrelinhas, o pulsar do ser,
a teoria da existência
única.
Talvez a percepção do
teu sinal
me levasse ao
conhecimento desse olhar que questiona
o homem absorto da
realidade dessa existência
que poderia escrever a
quatro mãos
o que o presente
desconhece do futuro.
8.
Se inventou sinais,
criou-lhe uma teoria
para que o conhecimento
fosse completando com razão
o que autentifica o ser
e a sede de sair de si.
Entre as árvores o seu
aposento,
talvez a explicação das
folhas, das veias, da resina,
a incógnita dos céus,
sendo seu habitante.
A priori o tempo e nele
a casa habitada de interrogações,
da seara ao pão, da
paisagem ao destino da fome,
o fogo da besta, a
perversão da propriedade do espaço
e da fronteira.
Instrumentos de matar
solidificam a aridez
das memórias, o deserto da ignorância.
Exposição ao perigo, a
experiência do aventureiro
que, em território
desconhecido, se entrega
ao mistério e
imediatamente não diz
o que a reflexão
aconselha como prova de existência
na descoberta do que
entende de si.
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