domingo, 28 de março de 2021

[0730] Juergen Heinrich Maar oferece-nos um poema do seu livro "Poemas domésticos" - ed. Papa-Livro Florianópolis, Brasil, 2000


Vejo-te novamente na claridade de estio

Tão suavemente, tão novamente na idade

Do primeiro beijo que te vejo continuadamente

Na atordoada mente do primeiro amado,

Na toada ausente do amor calado

Hoje renovado, que consente, enquanto sente,

O ardor da flor, o amor presente

No primeiro beijo.

Materializo-te entre véus e veludo

Enquanto visualizo entre os céus o tudo

Que já me ofertaste quando despertaste

Na alma do amante mudo

Os horizontes abertos, certos sobretudo

Até hoje, quando o jovem regeneraste

Que te cingiu no primeiro abraço,

Que repousou a dor no teu regaço

Durante o primeiro abraço.

Reencontro-te à janela, ora mais bela

Que a figura singela que vela

Desde dias incontáveis meus sonhos de rei.

Que vela insondáveis, tristonhos, eu sei,

Todos os momentos, que aparte os tormentos

Que acompanham o afastamento;

Do reencontro renasce, tão mais bela

Porque mais perene a iluminura

Que segura perpetua entre minha mão e a tua

O doce êxtase do primeiro encontro.

O êxtase festivo da alegria pura

Do primeiro encontro.



sexta-feira, 12 de março de 2021

[0729] Ainda Luís Palma Gomes, quase nosso poeta residente


MAIS UM POEMA


 Ao professor António Castro Caeiro


É só mais um poema.

Há tantos que não pode haver tantos que o sejam.

Então o que é? De onde chegam? 

Qual a natureza desta embriaguez lúcida que me toma?


Onde mora o centro fértil desta harmonia?

Fora ou dentro?

Será um  coito ou uma afirmação desabrigada da loucura? 


Os pássaros respondem a todas estas perguntas. 

Não os entendo, porém.

Talvez seja isso mesmo um poema, 

uma tentativa mais para entender a fala dos anjos 

ou dialeto interior dos pássaros que fomos ou seremos, 

porque o presente não existe.

É um tempo demasiado puro e escasso

para a imperfeição dos sentidos.


Onde ia eu? Ah, sim, o poema...


Dizia então que o poema não é o que parece ser,

porque nunca havemos de chegar à essência  das coisas.

É o que a ciência dos computadores chama de firewall humana.