DECRESCENS VITA
Sempre que me aflora o advérbio "talvez", há de certeza um esquecimento líquido correndo, espraiando-se pela vizinhança de mim mesmo.
Enfrento os meus limites quando apenas posso pensar nas marinhas fortes de Esposende. Estático, trago comigo as palavras e o seu ideal tão longínquo, quanto vertical, e tão próximo do sol como da profunda infância.
O dia abre-se novo, mas previsível. As mulheres inauguram-no, parideiras agora sem dor, lavando as cores serenas num rio que passava por aqui e — mesmo que os pássaros ainda nele falem — jamais voltará à presença determinada das árvores que estas ervas veneram sem saberem porquê - a habitual ausência de razão para qualquer veneração, diria.
Levanto os olhos e reparo que os outros não escrevem poesia por agora. Talvez tenham escrito em casa ou a guardem para as férias grandes, ou tão-só não tenham lido Ruy Belo, como eu o fiz ontem à noite.
O dia decresce desde que nasce. E nós, rendidos pela nascença, aceitamos este crescimento da morte, banalmente, como a um chamamento de pardais, ou à forma arredondada das laranjas.
Chamo tédio adocicado a este lapso que interrompe as sonâmbulas viagens que faço para um destino comum e vulgar de pedras em queda até ao entendimento do poço. E sem caminho algum para regressar, caio.
Adorei.....
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