sexta-feira, 23 de novembro de 2018

[0438] Edmundo Bettencourt, o libertário


Edmundo de Bettencout nasceu no Funchal em 1889 e faleceu em Lisboa em 1973. Poeta e cantor, funcionário público, delegado de propaganda médica, celebrizou-se cantando o fado de Coimbra. Integrou o grupo fundador da “Presença”, de que se dissociou em 1930, quase que se antecipando ao que foi o surrealismo  (embora dele se aproximando, colaborando na revista “Pirâmide”)


AR LIVRE

Enquanto os elefantes pela floresta galopavam
no fumo do seu peso,
perto, lá andava ela nua a cavalgar o antílope,
com uma asa direita outra caída.
E a amazona seguia...
e deixava a boca no sumo das laranjas.
Os olhos verdes no mar.
O corpo em a nuvem das alturas
- a guardadora
da sempre nova faísca incendiária!


APARIÇÃO

A mulher que por mim passou na rua, há pouco,
foi uma coisa diáfana, gentil,
cedo, a pairar
na sombra dum jardim
com flores, em baixo, ajoelhadas,
ao senti-la na altura,
e mandando-lhe o aroma em lágrimas, desfeito,
para mantê-la em uma nuvem branca...

Mulher, coisa diáfana, vaga e bela, sem desenho,
logo fluido animando o colo duma nuvem, nuvem,
num ápice, trucidada pelo vento!


O SEGREDO E O MISTÉRIO

Mistérios a pouco e pouco vão morrendo
e extenuados de vigília os anjos
são afinal a sussurrantes sibilinas vozes
que desvendam adivinham segredos
atrás de sentinelas
cuja ferocidade é uma ironia de ternura…
Na palidez da luz
cercando uma velha cabeça
a quem um sono de embrião já tolda os olhos
sorriem enigmáticos os sonhos.

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