Torquato da Luz nasceu em Alcantarilha em 1943 e faleceu em Lisboa em 2013. Jornalista, professor e poeta, director dos jornais “Jornal Novo” e “A Tarde e da RTP 2, pertenceu à Alta Autoridade para a Comunicação Social
PAIXÃO
A vida ou é paixão ou não interessa,
tudo o mais é somente imitação
e, por mais que dês voltas à cabeça,
não acharás outra razão
que dê sentido a esta caminhada
de aparente rumo ao nada.
Apenas a paixão sabe explicar
o que não tem qualquer explicação:
esta urgência de se dar
sem supor compensação.
APENAS AFLIÇÃO
Apenas aflição e nada mais.
Um arrepio correndo o corpo todo.
Estar aflito é um modo
de estar com os demais.
Aflito. Como se um rio
de súbito saído do seu leito
afogasse o navio
do corpo a que estou sujeito.
Não temas. É aflito que escrevo.
Aflito realizo
ser de tudo o que vejo o dono e o servo.
Tudo o mais que preciso
é saber que me devo
um permanente aviso.
O QUE DER E VIER
Tributário apenas da verdade,
avesso a peias e grilhetas,
feito da massa dos poetas
e dos que amam a liberdade,
sensível à dor própria e à dor alheia,
lutando até ao fim por uma ideia
de peito aberto e sem ter medo
de nada nem de ninguém,
capaz de guardar segredo
mas de o revelar também,
eis como sempre hei-de ser
para o que der e vier.
QUANTAS VEZES TE ESPEREI NESTE LUGAR
Quantas vezes te esperei neste lugar
quantas vezes pensei que não chegavas
quantas vezes senti a rebentar
o coração se ao longe te avistava.
Quantas vezes depois de teres chegado
nos colámos no beijo que tardava
quantas vezes trementes e calados
nos entregámos logo sem palavras.
Quantas vezes te quis e te inventei
quantas vezes morri e já não sei.
PRESENÇA
Já não estás onde estavas, já não estás
onde sempre te vi.
Mas, olhando o lugar, sinto-te aí
e recupero a paz.
O que conta não é o que se sabe,
tão-pouco o que se vê.
O que conta é aquilo que não cabe
dentro dos olhos, mas se crê.
Sem comentários:
Enviar um comentário