Nascido em Viana do Castelo em 1923 e falecido em Lisboa em 2010, António Manuel Couto Viana foi professor, dramaturgo, encenador, tradutor, ensaísta e poeta. Foi director do Teatro do Gerifalto, da Companhia Nacional de Teatro e director das revistas “Graal” e “Távola Redonda”. Recebeu o Prémio de Poesia Luso-Galaica Valle-Inclan e o Prémio Antero de Quental.
PEDRA TUMULAR
in "Mancha Solar"
A minha geração fugiu à guerra,
Por isso a paz que traz não tem sentido:
É feita de ignorância e de castigo,
Tão rígida e tão fria como a pedra.
Desfazem-se-lhe as mãos em gestos frágeis,
Duma verdade inútil por vazia,
E a língua imóvel nega o som à vida,
Por hábito ou por falta de coragem.
Se há rumores lá de fora, às vezes, lembra:
Porque é que pulsa o coração do mundo,
Precipitado, angustioso, ardente?
Mas depressa submerge na indiferença
- Que lhe deram um túmulo seguro;
E o relógio dá-lhe horas certas, sempre.
DEZASSEIS ANOS, TALVEZ
Dezasseis anos, talvez.
Vejo-a, no café, cada manhã,
A folhear, atenta, um compêndio de inglês,
Com um perfume a Escola e a maçã.
Não me canso de a olhar. Às vezes, olha
(Um velho!), num desvio de atenção,
E logo volta a folha,
Enquanto molha
o bolo no «galão».
Eu saio, com pesar, bebida a «bica».
Ela é a minha manhã,
Tão natural, tão clara... que ali fica.
- Que saudades da Escola! Que fome de maçã!
DESPOJO
E, agora, o que faremos?
A quem legar o que resta
Do simulacro de festa
Que tivemos?
Quem aproveita os detritos
De uma alegria forçada?
Quem confunde aflitos gritos
Com imposta gargalhada?
Iremos por onde alguém
Descubra os nossos farrapos.
Vês flores no jardim de além?
– Vejo sapos.
Sem comentários:
Enviar um comentário