Nascido no Porto em 1953, Amadeu Baptista é uma revisita deste portal. Deve publicar em breve (já está no prelo) o seu original que venceu o Prémio de Poesia Joaquim Pessoa de 2018.
Poeta e tradutor, obteve o Prémio Nacional de Poesia Natércia Freire de 2007, o Prémio Literário João Lúcio de 2008, o Prémio Espiral Maior (Espanha) de 2008 e Prémio de Poesia Cidade de Ourense (Espanha) de 2013.
“ibn Mucana” honra-se em acolher a sua colaboração.
GEORGE FRIEDERIC HANDEL: LA PAIX, DE MUSIC FOR THE ROYAL FIREWORKS
Há uma curta distância entre o céu
e a terra,
eu posso imaginar as aves inquietas,
o que passa é forte
como um remo abrindo as águas
e a imagem do homem.
Deste lado da luz
o horizonte em chamas
nomeia a solidão,
é grande o ar,
a justa partição do que redime
pelo precário poder
dos deuses,
a chama ilesa.
É do fogo que chega
este mistério,
pelo inefável arde,
o eterno sopro em pedra
e som
– a paz do mar.
LUDWIG VAN BEETHOVEN: ODE AN DIE FREUDE, DA SINFONIA NO. 9
Não sei se isto é um hino e os anjos
precisam deste instrumento
para ampliar o silêncio. O que sei
é que chega de longe esta surpresa
de poder segmentar em força o coração
que em mim pulsa e eu não sei
de onde vem quando na música
pressinto um tema que só aos anjos pode pertencer
pela pujante candura dos acordes
e a humilde magnificência da alegria.
Tudo quanto ignoro é que está bem.
WOLFGANG AMADEUS MOZART: ANDANTE, DO CONCERTO PARA FLAUTA E ORQUESTRA EM DÓ MAIOR K 373
Quero que os meus contemporâneos
me contem na minha melhor fase, ainda que não
me ouçam, ainda que engulam silenciosamente
a inveja com que me aceitam, ainda que saibam
que tudo quanto fiz prevalecerá inaudível
até à minha morte, tantos foram
os obstáculos que levantaram à minha passagem
e nenhuma grandeza pôde vencer, nenhum desprezo.
Eles sabem que se o nosso encontro se desmoronou
e o mau juízo que fizeram de mim
se cobriu de esquecimento e premeditada ignorância
foi porque pertenci ao futuro do meu tempo,
ao que houve e há e há-de haver
no coração dos séculos.
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