quinta-feira, 13 de setembro de 2018

[0093] João Vário e a profunda revolução na poesia cabo-verdiana

Principal pseudónimo do poeta, escritor e cientista cabo-verdiano João Manuel Varela, nascido no Mindelo em 1937 e ali falecido em 2007, João Vário também usou os pseudónimos de Timóteo Tio Tiofe e Geuzim Té Didial. Um dos autores mais importantes da literatura de Cabo Verde, a sua obra (muito influenciada por nomes com T.S. Eliot, Ezra Pound, Saint-John Perse e Aimé Césaire) é no entanto pouco conhecida mas teve forte repercussão na poesia cabo-verdiana actual. Estudante de Medicina em Portugal, alguns poemas seus ilustram o surrealismo português. Registamos aqui um dos seus densos e difíceis poemas: 


Há muito passado no estar aqui com o tempo,
Fim e reconhecimento, e não sofrendo nada mais do que o tempo concede
Fim de novo e reconhecimento de novo
E tudo é crime, ou crime sempre, crime ou crime,
Criminosamente crime,
Quando arriscamos a intensidade, comemorando.
Aumento e festa, ou cilício, e tempo de cair e tempo de seguir,
Tempo de mal cair e tempo de mal seguir,
Oh amamos tanto, amamos tanto estar aqui com o tempo
E sabendo que há nisso pouco passado.
Porque maiores que os desígnios da vida
São os desígnios da medida e, divididos
E dois por eles, com eles indo, se por eles
Ganhamos o tempo, pedimos a forma mais fácil
De indagar que vamos morrer e, um dia, se
O tempo for deles e, a memória, de outros,
Havemos de ser úteis como mortos há muito,
Sem que a causa, o delírio, a designação,
O julgamento nossa medida abandonem,
Dividida em duas por elas, e ganhando constância.
Depois, depois faremos ou fará o tempo, por sua vez,
Aquele blasfemíssimo comentário,
E então consta que amámos.

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