LEONOR FINI
Qual é a voz que me canta
que me chama e desafia
a ir pela estrada onde o sofrimento do mundo
está guardado como para uma boda?
O doido penar da minha alegria
na sala dos sem coração
grita para todos os pássaros que me conheceram
Lâmpada, lâmpada de todas as desgraças
eu sei que o teu semblante me aterrorizou
e os lamentos estão neste lugar
como uma bela mulher de areia e neve
E eu adoro-te todavia
pois tu és como eu sou
como eu sempre fui
uma criminosa
a criminosa das horas flamejantes
doridas e sem medo
A tua mão tocou-me
bailando sobre tudo o que era nosso
a tua mão que se aproxima dos seios
das estátuas que crescem nos soalhos
E entre nós e o tempo das suas mágoas
sòmente está aquilo que não fomos.
O teu corpo, desfeito, recusa-se
o teu corpo, sem o ser, é a luz
mas o terror destrói a luz, na luz apodrece o riso
tudo o que existente foi para além do sacrifício
Os golpes do fogo tiveram a coragem de soar
uns contra os outros
anilhas de infinita ternura
e eu sei que o jogo não mais findará
A claridade da rosa ainda está escondida
nas formas das palavras ao acaso perdidas.
in “Fábrica Nocturna”
Pintura de Nicolau Saião |
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