terça-feira, 27 de novembro de 2018

[0449] NUNO REBOCHO, POEMAS DE TERÇA-FEIRA (8) Nuno Rebocho, o manobrador de palavras


O autor sempre procurou o outro lado das coisas, perscrutando-as até ao âmago da sua complexidade. Cada coisa vale pelo seu significado e pelo que com ela transporta, vale pelo seu nexo e pelo seu sexo, pelos cheiros que alimenta e recorda. Ou seja, cada coisa – porque não está só – está em “diálogo” com cada coisa. E Estando só, está em “diálogo” consigo mesma: a vida é diálogo. Esta é uma constante da poesia de Nuno Rebocho.    


O ONANISTA

andamos ao derredor das palavras
ansiosos
de um fonema que deslumbrando-nos
nos descubra

as palavras-sílica
física
de seios breves como os teus
de ancas arrojadas como as tuas
de púbis violento
palavra-amor
palavra-dura
palavra-dor

palavras com pele braços esgotos
artérias do imaginário que condenso
espaços rotos aos quais pertenço
enrodilho-me nelas no desassossego
de fazer amor contigo
orgasmos do não dito
saliva do infinito a percorrer
o sexo o cérebro o bolo raquidiano
os pulmões
palavras acontecimentos como andorinhas do mar
trevos da pérsia estrelícias miosótis

palavras homens
palavras feridas
rádio telefone televisão
telegrama computador satélite
ondas hertzianas feixes
sinais
infinitamente pequeno sou condutor de tudo isto
pulso quase a estoirar como uma supernova

palavras-sonhos
palavras-desejos
margens do possível
palavras-jato
onde exercito
noites da tua boca
áureas do teu peito

palavras-tantas
irrequietas
fluidas
idas
palavras-montras
carruagens
viagens
palavras-movimento
lento
rápido
palavras-árvores
sais ácidos

sintagmas
hemogramas

no sentimento do tempo
cinzelado na carne
palavra-facto
ato
arde

Sem comentários:

Enviar um comentário