domingo, 30 de setembro de 2018

[0222] Yolanda Morazzo


Nascida em Mindelo, ilha de S, Vicente, em 1927 e falecida em Lisboa em 2009, Yolanda Morazzo Lopes da Silva foi uma das importantes representantes da poesia cabo-verdiana. Viveu em Angola de 1958 a 1968, indo viver depois dessa data em Portugal. 


BARCOS
 
"Nha terra ê quel piquinino
        ê São Vicente ê quê di meu"


Nas praias
Da minha infância
Morrem barcos
Desmantelados.

Fantasmas
De pescadores
Contrabandistas
Desaparecidos
Em qualquer vaga
Nem eu sei onde.

E eu sou a mesma
Tenho dez anos
Brinco na areia
Empunho os remos...
Canto e sorrio...
A embarcação
Para o mar!
É para o mar!...

E o pobre barco
O barco triste
Cansado e frio
Não se moveu...


A UMA QUALQUER

Não foi por amor ao dinheiro
nem foi por jóias
nem sequer por um vestido de seda.

Nem foi também por teres casa
móveis decentes, melhor vida.
Não, não foi por nada disto.

Tu, só tu sabes por que sorriste
e o teu coração bateu um pouco mais forte
quando o barco americano entrou no porto...


COLHEITA

Mistério? Não rapazes
Nada de mistérios!
É tempo de aniquilar os enigmas
Todos os enigmas
E estrangular os soluços na garganta.
O Mundo move-se, Amigos,
A noite virou madrugada
A vida é mais do que um cântico
A vida é uma certeza.

É por isso rapazes
Que me apetece pegar numa enxada
Atirar para os ombros as pás e as picaretas
Todas as picaretas do mundo
E ir assim por esses campos fora.

Vamos, Amigos. Basta!
Tirem as mãos dos bolsos
E deixem esse ar de interrogar as núvens.
É tempo de começar
E eu preciso da vossa ajuda.
Camaradas! Venham comigo!
Tragam também as foices e o arado
E vamos.
          Olhai!
                    É tudo Nosso!...
A terra
Uma seara imensa...
O trigo a perder-se no longe
Amadurece.
Não o deixemos apodrecer.
É preciso ceifá-lo, Irmãos!

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