terça-feira, 12 de março de 2019

[0606] Nicolau Saião regressa

Três poemas de Nicolau Saião que está de volta e em boa forma.


ÁGUA

De corpo
Onde acabas e recomeças
De terra
Onde é teu o perfil incompleto
De fogo e ar
Onde exultas e te revolves
Do que dentro existe e cessa
Do que de fora brota

Daquilo que nunca te encontrará
Do que é pequeno e amplia o mundo
Do que jamais se perdeu

Do que se sabe e repousa
Do que não se encontrou

Do que morre
Do que é silêncio e claridade
Do que é mais que um sangue

Um puro momento feito
Entre ti e o teu reflexo inerte.


SORRISO

Como pode entender-se
sua firme estrutura
de momentos e coisas
para esquecer   lembrar? Participa das cores
(amarelo  vermelho)
com que o nomeiam
e também da incerteza
com que o olham. Antecipa verdades
antepõe-se a mentiras
e serve de desculpa
como serve de enleio. E faz inda esquecer
o tenso  o trémulo
sinal do dia
no rosto de quem já
a noite teme.
Imaterial, tão breve
e tão distante
- mas o peso de séculos
nele mora: um sorriso de quem
conhece o tempo
que pelos anos vai
com sua mágoa junta.

A voz que o justifica
sem que o encene  o talhe
para que sempre exista

em toda a face humana


RESISTÊNCIA

Não apenas a música
mas o som
o ruído que envolve 
o oculto grito

Não o nome somente
mas vestígio
o timbre recordado de seu
espaço

Não apenas figura
mas silêncio
silhueta ou contorno
na memória

Não o medo ou o azougue
sobre esta carne morta

Mas um vívido traço
ainda que incompleto

Mas singeleza como
um corpo inconformado.

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