terça-feira, 16 de abril de 2019

[0627] In memoriam de Maria Alberta Meneres


MARIA ALBERTA MENÉRES, UMA PIONEIRA

De seu nome completo Maria Alberta Rovisco Garcia Menéres, nasceu em Mafamude, Vila Nova de Gaia, em 1930, e faleceu em Lisboa, em 2019. Professora, jornalista, escritora, dramaturga  e poeta, foi esposa de E. M. Melo e Castro e obteve o Prémio Internacional de Poesia Giacomo Leopardi em 1960. Dirigiu a revista “País”.


AS PEDRAS

As pedras falam? pois falam
mas não à nossa maneira,
que todas as coisas sabem
uma história que não calam.

Debaixo dos nossos pés
ou dentro da nossa mão
o que pensarão de nós?
O que de nós pensarão?

As pedras cantam nos lagos,
choram no meio da rua,
tremem de frio e de medo
quando a noite é fria e escura.

Riem nos muros ao sol,
no fundo do mar se esquecem.
Umas partem como aves
e nem mais tarde regressam.

Brilham quando a chuva cei.
Vestem-se de musgo verde
em casa velha ou fonte
que saiba matar a sede.

Foi de duas pedras duras
que a faísca rebentou:
uma germinou em flor
e outra nos céus voou.

As pedras falam? pois falam.
Só as entendem quem quer,
que todas as coisas têm
uma coisa para dizer.


CÂNTICO DE BARRO

Inquieta chuva, inquieta me dispersa,
esquecida a tradição e o cansado som.
Dentro e fora de mim tudo é deserto
como se as ervas fossem arrancadas
ou se esgotasse a dor por que se chora.

Na grande solidão me basta, e a contemplo
para o sonho interior que me resolve!
Tão fácil é esperar, que já nem me sinto
o que vem a dormir ou a morrer
na mesma angústia que o silêncio envolve.


PRETEXTO

Por que não cai a noite, de uma vez?
- Custa viver assim aos encontrões!
Já sei de cor os passos que me cercam,
o silêncio que pede pelas ruas,
e o desenho de todos os portões.

Por que não cai a noite, de uma vez?
- Irritam-me estas horas penduradas
como frutos maduros que não tombam

(E dentro em mim, ninguém vem desfazer
o novelo das tardes enroladas)

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