segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

[0591] Feliz Zau, vadiando mundos


Nasceu em Lisboa em 1950, de ascendência cabo-verdiana. Historiador, investigador, professor, músico, escritor e porta, em 1975 naturalizou-se angolano 


UM DIA

A minha pele é escura como a noite.
Traz cicatrizes do açoite
e marcas do tráfico negreiro.
A minha cor escura não ilude
a intolerância e a inquietude:
sou africano, podia ser antilhano,
afro-brasileiro ou afro-americano.
A minha pele é escura como a noite
e para que não haja engano,
não sou cigano, nem indiano.
Sou africano por cultura e opção.
Poderia ser mouro, antilhano,
afro-brasileiro ou afro-americano.
Em qualquer dos casos
Serei o teu ás, o teu campeão,
aquele que tanto procuras
para a vitória da tua equipa
ou, até mesmo, da tua selecção.
A minha pele é escura como a noite
e o sangue azul a que pertences
é tão vermelho como o meu.
Provéns de árabe, de berbere,
ou talvez de um negro escravo qualquer
que, para a serventia da Coroa,
entrou por Lagos ou por Lisboa...
Depois de alforriado,
lá para os lados de Alfama,
Serias um bailador de fado
em casas rotuladas pela má fama.
A minha pele é escura como a noite.
Agora por conveniência,
sinto vontade de te dizer,
que encontrei num nobre europeu
parte da minha ascendência.
A outra a que pertenço
tem séculos de humilhação
e décadas de independência...
Perdoa a minha indignação,
mas entende a minha pertinência
nesta nossa conversação.
Só os burros não mudam...
e um dia... um dia, meu caro,
aprenderás a julgar os homens
apenas pelo seu valor moral e ético.
Basta, tão somente, que te revelem
o segredo do teu código genético.

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