terça-feira, 18 de dezembro de 2018

[0503] Fernando Grade, os haiku


De regresso a este portal, Fernando Grade recorda-nos alguns dos seus haiku.


ABAIXO OS NEUTROS

Não se pode viver muito tempo
 por dentro de uma maçã.


FOLHA DE OBRAS

A demolição começa pelo nariz
pelas rebeldes narinas inteiriçadas de brisa.
Mas a boca calceta-se com beijos.


RONDA PELOS JARDINS

Canícula atiçada por cães.
-- Qual de vocês, meninos do bairro todo,
 é o melhor atleta a beber água


ESTRADA DE FLORES

A única estrada de flores são os olhos.
Ver é sentir tombar as paisagens,
água assobiada sobre o corpo.

                                   
EXERCÍCIO CORPORAL

Fui ao nome de Filomena, e roí: ficou Filó,
continuei a avançar queimando letras
e deu Fi. Finalmente,
na tarde caída, assoprei:
-- Fff...-- e assim se perdeu Filomena
na minha vida.


AS SOBERBAS CONSTRUÇÕES DO IMPÉRIO
OU A HISTÓRIA DO SUOR ESCRAVO

 Pirâmide ou piranha?


DIA DE RESTOS
(DEPOIS DO NATAL) 

O que ficou do presepe foi um osso de vitela
expurgado ou doce de
figo como música chuvosa.

E nenhum querubim sobe às paredes da casa
onde o gato (tépido) faz ninho,
convencido que tem asas.


QUANDO O CRÍTICO FAZ CRI-CRI

João Gaspar,
crítico menor
do meu país de opereta,
crítica para a História
-- à flor da epiderme
e das dedicatórias
-- o rabo dos poetas.
                                         

EXCLAMATIVO ÀS PORTAS DA CIDADE

Não há tusa
 para tanta musa!
                                           

PERGUNTANDO SEMPRE

 -- E os crimes, meu general?
  -- Ah, isso foi há muito tempo... Já ninguém se lembra!


EXCLAMATIVO EUROPEU

Chiça:
que a menina aprendeu línguas
na Suiça!

                                         
HAIKKU PARA O BUDA PROLETÁRIO

Seis dias de suor castanho
para criar a flor e o viúvo.
Ao domingo teremos cerejas?
                               

CONTRA A GEOMETRIA ROMÂNTICA

Nunca tive jeito para a geometria
porque vejo sempre na pirâmide
o suor de quem a construía.

Sem comentários:

Enviar um comentário