Dando-os a honra de revisitar este portal, Luís Filipe Sarmento apresenta-nos mais seis poemas do seu ainda inédito “KNK”.
12.
Sentiu-lhe a presença e pensou-a
e quis conhecê-la porque pensou
que a sentiu
O que ela é desconhece
mas não ignora a realidade que o afecta
A gramática da pele intuiu-a em si
mas não entendeu
como o mistério o afectaria
Olhou-a, mas não a observou,
e reteve olhos-objecto
de dimensão extravagante
– só olhos –
– apenas olhos –
que, com a cumplicidade da metáfora,
o deglutiu até à digestão do êxtase
13.
Deu um nome ao que lhe incidiu na pele
e, suspendendo-se no tempo,
desvendou o mistério da sua presença
antes do contacto. Existia no destino
e ainda que exterior lhe fosse
já o seu código espiritual o transfigurava
no esboço do desejo.
Ao deixar-se transcender pela surpresa
só o tempo imprevisto do silêncio
lhe equilibrou os sentidos
e deixou-se ir
apesar da sua impenetrabilidade.
14.
O conflito entre o que não quer e o espaço
que lhe ocupa os sentidos consome-lhe o tempo;
ao libertar-se de escória
que não deveria configurar uma inevitabilidade
deixa de se entregar à grandeza
de uma relação pura entre o que a loucura lhe oferece
e a manufactura artesanal da palavra
que o pensamento ordena e desordena
segundo um ou outro produto ocasional da natureza.
O conflito é uma repetição desinteressante,
a loucura uma viagem ininterrupta
ao espaço luminoso de si
onde se intui na dimensão interna do tempo.
15.
Quando decide observá-la dá-lhe
a dimensão do espaço. Não o é.
Ela apenas o ocupa.
Existe antes dela, mas para o observador
ela é a grandeza dessa intuição à priori.
Submete-se ao seu espaço
e deixa escoar o tempo
vagarosamente
saborosamente
como uma dimensão infinita
que lhe estimula a boca e a língua;
dentro do seu espaço
e com o tempo que a natureza lhe dá
recusa a morte
na sua gravidez imprevista
à explosão do prazer
que o torna infinito.
16.
A geometria do seu corpo não delimita
o seu espaço nem lhe limita o gesto
incerto, o toque noutra pele, ou talvez
o vazio, a mancha poliédrica que busca,
não o tempo perdido, dá-lhe existência
no olvido dos relógios, e a massa que subsiste
é desejo enquadrado no seu íntimo subterrâneo.
Se o intuiu logo o rosto se lhe iluminou
porque em si a entidade do ser
implicava a consciência da sua plenitude
na tripla dimensão de uma acoplagem
perfeita enquanto a saliva lhe lubrificava
o infinito que se lhe abrira à visão do prazer
como um convite à experiência da humanidade.
17.
Ao observá-la sabe que existe naquele tempo
– o seu tempo que lhe invade o espaço –
e não num outro, alheio a si, onde o que existe
é-lhe paralelo numa dimensão que desconhece.
Nada para além dela o sensibiliza
– nem sequer o intui – tão só aquele corpo
que lhe ocupa o espaço e o tempo
que dura a sua admiração, a serenidade
que o maravilha, o assombro mágico que o seduz.
O tempo é da dimensão do seu olhar,
o espaço da subtileza transcendente do seu corpo.
Do som brilha a insustentável leveza da respiração
– a palavra denunciaria um conflito que aqui não tem lugar –
e se o tempo corre na sua contemplação
o espaço suspende-se em tranquila eternidade.
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