segunda-feira, 24 de setembro de 2018

[0184] Mais uma visita de Luís Filipe Sarmento



Luís Filipe Sarmento faz o favor de revisitar este portal. Como sempre, “Ibn Mucana” tem a honra de o acolher: a sua poesia é sempre bem-vinda. Seguem mais quatro poemas do seu livro (em preparação) “KNK”


8.

Se inventou sinais, criou-lhe uma teoria
para que o conhecimento fosse completando com razão
o que autentifica o ser e a sede de sair de si.
Entre as árvores o seu aposento,
talvez a explicação das folhas, das veias, da resina,
a incógnita dos céus, sendo seu habitante.
A priori o tempo e nele a casa habitada de interrogações,
da seara ao pão, da paisagem ao destino da fome,
o fogo da besta, a perversão da propriedade do espaço
e da fronteira. Instrumentos de matar
solidificam a aridez das memórias, o deserto da ignorância.
Exposição ao perigo, a experiência do aventureiro
que, em território desconhecido, se entrega
ao mistério e imediatamente não diz
o que a reflexão aconselha como prova de existência
na descoberta do que entende de si. 

9.

À noite, fugido ao pássaro inquietante, o homem
atormentado esconde-se do destino para superar
a sua condição de existência. Amplia-se ao pensamento
e abisma-se na perplexidade de se elevar
às questões que não esgotam a sua curiosidade.
Caminhos obscuros, cruzamentos de contradições
e o desejo incomensurável de experimentar
o que a pele desconhece condu-lo
num eterno nomadismo de si ao ritual dos pássaros
tão perturbantes que esperam a podridão da sua carne
para que o anonimato o converta em desperdício.
E da metafísica passou à televisão
como se o Olimpo se renovasse a cores
durante um banquete de tostas místicas. 

10.

Na ordem do tempo, a aventura de sair
para ser, do olho à boca, a experiência do gesto,
o corpo como primeira impressão.
Reconhece a mãe, a madeira, o primeiro ecrã
de um mistério incomensurável.
As estrelas ainda não têm nome
e os mitos tardarão na geografia dos sonhos
e dos desejos.
Expõe-se ao dilúvio de interrogações
e sabe que os dias terão obstáculos.
Não esquece onde está e determina
os passos, eleva-se e percebe o horizonte
de uma possibilidade a haver.
Quando desperta, a origem dá-lhe a dimensão
do caminho andado e em si há algo que se expande
num crânio que se adapta ao que desconhece.
A fêmea observa-o e ele treme.

11.    

Se não se vender ao dogma
tudo o que aparentemente conhece
foi experimentado a partir de fontes
sem experiência.
Elabora ficções a partir de ideias que interroga
e constata o que há muito pressente:
o além é uma viagem sem limites
e durante a sua jornada
a miragem do horizonte é um estimulante de impulsos,
um voo no espaço desconhecido do entendimento,
o vazio tão puro que o liberta de toda a suspeita.
Expõe-se ao desejo e ela aniquila-o com prazer.

Sem comentários:

Enviar um comentário