domingo, 16 de setembro de 2018

[0128] Nuno Rebocho e as lições da História

Regressado a Portugal depois de uma juventude em Moçambique, Nuno Rebocho esteve ligado (com Armando Ventura Ferreira, Costa Mendes, Fernando Grade, Hugo Beja e Júlio-António Salgueiro) à criação de um movimento poético em 1963 – o  des-integracionismo. 

É autor de uma extensa bibliografia, cidadão honorário da cidade de Ribeira Grande de Santiago (Cabo  Verde, dita "Cidade Velha", património Mundial da UNESCO) e membro do PEN Clube de Portugal. 





O REGICÍDIO

mataram o rei e eu não curei a minha dor de fígado
que é uma dor tão reflexa como as dores da história:
mataram e não fizeram mais: porque jamais
a morte é a forma convexa de um sonho ou uma vitória.
que mata o cano da arma       que clama o gatilho? 
balas de ódio: o veneno da raiva.
e não consta que a vida aplauda
- não consta que a cauda da víbora seja mãe de filho.

é a alma que canta e empurra e levanta
a vontade de erguer sobre a cidade o clamor,
o vento seca as lágrimas de quem acalma a dor.
e que grita o estupor? o espanto
de matar a lei e nada mudar – só o amor muda
onde a lei castiga a divergência: matar é que nunca
nem que seja o rei nem que seja o réu
nem que seja o príncipe nem que seja o índice.
se é esse o princípio é essa a consequência

: que no caminho ninguém se iluda
com os sinais da morte - levanta-se da cama a história
veste o espartilho e não adelgaçam as ancas;
se o gatilho escarra ficam as pernas mancas.

viste e aprendeste – mataste e sofreste.
mataste. morreste.
e nada vingaste e em nada venceste. nada disseste.
apenas morreste.

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